Em Roma, como noutras partes do mundo antigo, as mulheres não foram especialmente favorecidas, mas algumas houve que fizeram a diferença. Márcia Antónia, filha de Marco António e de Octávia, a irmã mais velha de Augusto, foi uma delas. Sabemos que nasceu a 31 de Janeiro de 36 a.C. e que, ao que parece, nunca terá visto o seu pai, que trocou Octávia por Cleópatra antes dela ter nascido. Oficialmente divorciada em 32 a.C., Octávia foi viver com os seus filhos para casa de Augusto e de sua mulher Lívia, onde Márcia Antónia teve uma esmerada educação propiciada pela família real. O seu casamento foi bem cedo concertado: haveria de casar com Druso quando completasse 18 anos. Porém, apesar desta imposição matrimonial, o casamento de Antónia e Druso tornar-se-ia lendário pela sua harmonia, fidelidade e felicidade.
.
.
O poeta grego Crinágoras chamou-lhe "suprema em beleza e em espírito", Plutarco refere a sua beleza e discrição e Josefo lembra a sua castidade. Plínio o Velho acentuou o seu modo fino e delicado, dizendo que cuspir era contra a sua natureza. Alguns registos numismáticos e de estatuária transmitem uma imagem de beleza clássica e espírito penetrante. Por sua vez, Druso, o seu marido, era visto como um homem enérgico, carismático e muito dedicado à esposa. Com o seu irmão Tibério conquistou os Alpes e estendeu o poder romano às tribos germânicas.
.
.
Em 9 a.C., Druso, que era com frequência acompanhado pela mulher, caíu do cavalo e partiu uma perna, daí em diante sofrendo cada vez mais. Tibério, que estava em Roma, ainda chegou a tempo de ouvir o último suspiro de seu irmão, que acabaria por ser levado para Roma já morto. A mãe de Antónia havia morrido dois anos antes. Ovídio conta que Márcia Antónia, então com 27 anos, esteve à beira da loucura e do suicídio. Não haveria de casar com mais nenhum homem nos próximos 45 anos de vida que lhe restavam.
.
.
Porém, Antónia tinha três filhos e uma fortuna para gerir e, na sua villa em Bauli na Campânia, tinha ainda um famoso animal de estimação: uma lampreia a tal ponto estimada que Antónia lhe mandou fazer brincos. Dos seus três filhos, Germânico, Livilla e Cláudio, este era o menos dotado: a doença tornara-o afectado na voz, no modo de andar e em geral no seu comportamento. Quando Antónia queria apelidar alguém de estúpido costumava dizer "mais estúpido do que o meu filho Cláudio". Mas Sejano, um poderoso homem junto de Tibério (imperador desde 14 d.C.), haveria de conseguir casar o mais estúpido filho de Antónia - nas suas palavras.
.
.
Calígula sucederia a Tibério no imperialato romano, mas apenas por quatro anos, ficando conhecido pela sua insanidade, crueldade e depravação. Foi também ele quem atribuíu a Márcia Antónia os títulos de Augusta, de Virgem Vestal e de sacerdotisa do culto do divo Augusto. Seis semanas depois de Calígula chegar ao poder, Márcia Antónia morreria. Foram adiantadas duas causas para a sua morte: assassinato cometido por Calígula ou suicídio. Ambas algo improváveis. Antónia permaneceria como a tradicional matrona romana e um modelo a seguir por todas as mulheres que tivessem algum poder e liberdade. Um exemplo de devoção conjugal e independência de espírito - sem ironia.
.
.
Mas Antónia já não pôde ver o seu filho tornar-se imperador no ano 41 d.C. Se ainda vivesse, veria como o seu filho lhe reatribuíu o título de Augusta e organizou jogos anuais para celebrar o seu aniversário. A celebração de sua mãe não parece ter sido um caso de manobra política (tese plausível dada a influência do nome de Antónia nos círculos do poder), o que parece ser demonstrado pela duração e magnitude dos tributos concedidos por Cláudio a sua mãe, post mortem. Tudo aponta para um caso de simples amor filial. Afinal de contas mãe é mãe.
.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.